terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

TAMBEM NAO SOU CHARLIE

                                                                                                                     
A liberdade de expressão e o direito á informação são direitos fundamentais garantidos pela Constituição Federal Brasileira como componentes da cidadania. No entanto, pertencem a duas categorias distintas: a livre expressão é um direito civil enquanto o direito  á informação está entre os direitos sociais,tal como saúde, educação , segurança e trabalho . Não raro se estabelecem tensões entre os direitos individuais e coletivos que exigem limites para evitar a supremacia de um em detrimento da garantia do outro. Apesar de reconhecer o direito à livre expressão o próprio legislador, no Brasil, admitiu a necessidade de regulamentação de alguns itens relativos á comunicação, por exemplo, na propaganda de tabaco, álcool, medicamentos, agrotóxicos etc. A respeito da convivência entre os direitos fundamentais acima referidos, o filósofo Norberto Bobbio  em seu livro A era dos direitos propõe para superação do conflito de concorrência entre eles: “a dificuldade se resolve com a introdução dos limites à extensão de um dos direitos, de modo que seja em parte salvaguardado também o outro”. Por exemplo, no direito á liberdade de expressão por um lado, e no direito do outro de não ser enganado, escandalizado, injuriado ou difamado. Nestes casos, deve-se falar em direitos fundamentais não absolutos, mas relativos, no sentido de que a tutela deles se encontra um limite insuperável na tutela de um direito igualmente fundamental, mas concorrente”. A revista  satírica francesa Charlie Hebdo   é reincidente na sua atitude  desrespeitosa  com o alvo de suas críticas . A questão fica mais complexa quando este alvo são lideres  religiosos. Basta lembrar a intolerância demonstrada   em vários países com abordagem do filme ” Jesus Cristo superstar". Scott Long , ativista americano em direitos humanos, em seu artigo “Porque não sou Charlie”( FSP 18 de janeiro de 2015) lembra que a sátira não deixa de ser um exercício de poder, um olhar por cima dos pobres mortais e que tem efeitos bem diversos quando atingem poderosos ou quando atinge minorias como é o caso da comunidade islâmica . A sátira dirigida aos mais frágeis pode inclusive legitimar e acirrar preconceitos. Ironizando o profeta Maomé, grande líder fundador do islamismo não se está atingindo só ele, mas a toda uma corrente religiosa que ademais de ser , desde os primórdios, uma rival do cristianismo, tem sérios ressentimentos ao Ocidente em decorrência do combate sofrido ao longo dos séculos. Convém lembrar também que os mulçumanos sempre expandiram sua fé por meio da força e de conquistas militares. Por sua vez a violência perpretada pelos cruzados no Oriente médio são feridas abertas entre as duas correntes religiosas.  Considere-se ainda que o Alcorão, como todo livro fundador das religiões, tem interpretação diversa por parte das diversas correntes de seguidores quando diz: “ quem mata uma pessoa , sem que haja cometido crime ou semeado a corrupção na terra, é como se tivesse matado toda a humanidade”.Ora,se no entendimento de um fanático muçulmano  os cartunistas semearam a corrupção ao ridicularizar o profeta,  deveriam ser mortos(?!).Considerando este contexto histórico, fica ainda mais complexa a análise das decorrências do deboche da imprensa francesa contra o profeta Muhammad( 570-632) . Em análise simplificada e sob a ótica da nossa Carta Magna artigo 221 §IV ,o respeito aos valores éticos e morais devem ser considerados em todo veiculo de comunicação, preceito não observado pelos cartunistas do Charlie que avançaram sobre o direito do profeta e de seus seguidores de não sofrerem vilipendio ou dano moral. O caminho de combate à violência, ao terrorismo e ao fanatismo não é outro senão o da abolição do preconceito, do diálogo e das ações políticas que estimulem a solidariedade e o respeito aos diferentes. Convém deixar bem claro meu veemente repudio ao assalto e assassinato dos cartunistas, mas por toda argumentação acima devo declarar que também não sou Charlie.